sexta-feira, 29 de abril de 2011

Quem

É horrível o fato de não existir alguém inteiro, alguém completo, em essência. Uma única pessoa que não tenha sido poluída pelo capitalismo e todo seu sistema sujo. É assustador imaginar que ninguém escapa das manipulações da mídia, do consumismo, da politicagem.. Mas tudo isso é clichê. Pior é pensar que você se torna um estranho para si mesmo dentre tantas e tantas máscaras, tornando-se caricatura do próprio desenho. É estranho perceber que eu fundei minha vida em como deveria agir, como deveria ser, o que deveria falar, o que deveria sentir.. E tudo isso pra não magoar ninguém. Tudo isso pra dar aos outros o melhor de mim. O problema é que ninguém vive só do melhor! E agora eu estou perdida. Perdi o meu mal de mim. Perdi com ele minha identidade, meu eu, minha essência. Perdi.

quarta-feira, 20 de abril de 2011

'Esvazia. Preenche. Transborda.'

- Maria?
- Oi?
- Já dormiu?
- Pode falar.
- Que chuva, não?
- Sim. Que chuva!
- Maria?
- Sim?
- Não consigo dormir.
- Por causa da chuva?
- Não.. Por causa do barulho.
- Do barulho da chuva?
- Não. Do barulho vazio..
- Mas não tá vazio. Tá cheio!
- Sinto vazio..
- Não, boba, não sente vazio. Só não aprendeu a escutar.
- Me ensina, Maria.
- Descreve o barulho, então.
- É oco. É como uma bolha vazia...
- É porque vem de dentro.
- É seco. Parece duro como pedra; machuca.
- Você se prende ao desnecessário.
- Eu escuto o que grita mais alto, o que ensurdece.
- Faz silêncio. Esquece dos ouvidos, usa o coração.. O que você escuta?
- Paz. Esse som eu não sei explicar.. É como uma cachoeira, doce e suave.
- É porque tá cheio. Transborda!
- Maria?
- Oi?
- Boa noite.

quinta-feira, 14 de abril de 2011


É estranho quando não se cabe mais no mundo..
Quando o mundo cabe em si e não mais o contrário.

quarta-feira, 13 de abril de 2011

Conversa de sauna.

- Maria, acorda! O despertador já tocou..
- Ah, eu não quero ir hoje. Me deixa ficar? - diria que Maria falava entre-sonhos, pois nem se deu ao trabalho de abrir os olhos.
- Não, Maria; levanta! Sabes bem que é muito ruim sem você.
- Não sei de nada disso, só que hoje eu quero ficar.
- Levanta, Maria, já fiz nosso café!
- Então, só vou sob uma condição - Maria adora impor essas condições, acho que é pra sentir-se no controle.
- E qual é?
- A gente vai de onibus! - junto com a frase veio a maior cara de satisfação.
- De onibus, Maria? Por quê? A parada é longe e tá chovendo... Não vamos chegar a tempo.
- A gente vai de onibus, e tenho dito.
- Então corre, se arruma depressa.

- Grande idéia, Maria! Agora só nos resta esperar mais 40 minutos até o onibus chegar e já estamos ensopadas.
- Nossa, dá para parar de reclamar? Eu nem queria vir.
- Olha, é o nosso onibus? Quanta sorte!
- Sorte. Sorte.. Acho que você fala tanto essa palavra para me irritar.
- Também acho que todas as 'condições' que você cria são para me irritar. - enquanto eu falava subíamos os degraus do onibus, que mais parecia uma sauna - em dias de chuva todas as janelas permanecem fechadas.
- Onde eu sento hoje, Maria?
- Pensei que você já fosse capaz de escolher seu próprio lugar, mas já que você perguntou... Quarta cadeira, no lado direito.
- Exatamente onde eu imaginei. E você, onde vai sentar, Maria?
- Hoje eu vou em pé. - e que fique claro: não por falta de lugar.

Ando até o lugar escolhido por Maria. Sento ao lado de uma mulher negra, que devia ter lá seus 34 anos e pesava algo em torno de 120 quilos. O suor escorria por todo o corpo, e agora eu realmente me sentia numa sauna. A principio, sua expressão não foi de alguém que estava gostando de ser incomodada, visto que não faltavam cadeiras vazias, mas ela se moveu um pouco deixando, enfim, metade da cadeira livre para que eu pudesse sentar. Olhei-a com um sorriso nos olhos, como o de quem agradece.
- Bom dia! - exclamei.
Ela retribuiu com um olhar suave e um sorriso de meia boca.

Nunca disse isso a Maria, mas eu gosto profundamente de andar de onibus. Lá de dentro eu vejo a rua de uma forma diferente. Poderia passar horas dentro do onibus observando cada detalhe, cada rabisco na cadeira da frente e, principalmente, as expressões em cada rosto ali presente. - Enquanto eu pensava sobre isso meu celular toca, era uma mensagem de Maria: "Não esquece: também tens uma boca." Sim, eu entendi o recado e me dispus a obedecer.

- Que tempo louco, não é?
- É!
- Será que amanhã vai ser igual?
- Espero que não! - realmente, acho que minha presença já bastava, mas Maria insistia para que eu incomodasse ainda mais.
- Qual é o seu nome?
- Cristina.
- Bonito nome, tenho uma grande amiga chamada Cristina! - tudo mentira, era só pra puxar assunto.
- E você, como se chama?
- Maria. - de certa forma não era uma mentira, já que toda aquela situação foi criada graças a Maria mesmo.
- Belo nome. Para onde você tá indo, Maria?
- Tô indo pra aula, mas acho que não vou chegar a tempo.
- Sei bem como é isso, Maria! Acordei as 4h30 para chegar no trabalho, que só começa as 8h30, mas pelo visto também não vou chegar a tempo. - nessa hora, como um estalo, entendi o que Maria quis me mostrar.
- A minha parada é a próxima. Foi um prazer conversar com você, Cristina! E boa sorte no caminho, espero que você consiga chegar a tempo!
- O prazer foi meu, Maria. Boa aula!

Ando até Maria - a verdadeira Maria - que me espera com uma certa expressão de orgulho, e antes que eu falasse qualquer coisa ela se adianta:
- Vamos rápido, "Maria", você vai se atrasar.

terça-feira, 12 de abril de 2011

11/04

"As pessoas escondem seus sentimentos. É só por isso que nada dá certo; que todo tipo de relacionamento, amizades, casamentos, namoros e, algumas vezes, até relações entre pais e filhos acabam algum dia."
"Eu sei, Maria, eu sei."
"Então, já que sabe, não deixe que isso aconteça com você. Fale o que sente sempre. Não tenha vergonha, fale todo dia e pra todo o mundo!"
"Eu falo, Maria, eu falo."
"Assim você pode ter a confortável certeza que se não deu certo não foi por falta de clareza sua. O problema das pessoas é que tá na moda o fumê, todo mundo tem medo da transparência! - e eu falo da alma, claro, não dos vidros"
- Pausa para os risos.
"É verdade, Maria, é verdade."

... Silêncio

"Sabe o que me deixa confusa?"
"Não, Maria. O quê?"
"Eu sei disso. Você sabe disso. Todos também sabem disso.. Mas as brigas continuam acontecendo por falta dessa comunicação específica! Por quê?"
"Realmente, essa é uma boa pergunta, Maria. Não sei."

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Maria Isabel.

Esse texto não será como o de costume. Não será por dois motivos: o primeiro é porque, dessa vez, não escrevo movida por impulsos ou sentimentos; e o segundo motivo é porque vou apresentar uma pessoa muito importante na minha vida e que veio esses dias questionar o porquê de nunca ter sido mencionada no meu blog.. Segundo ela, 'não custava nada ter, ao menos, uma só linha que a fizesse se sentir importante'. Bom, venho hoje falar sobre Maria Isabel.
Maria Isabel tem 13 anos, embora eu não saiba exatamente há quanto tempo. O que realmente importa é que ela tem 13 anos. Maria Isabel mora na Rua do Bom Destino - e se você deixar ela pode passar 40 minutos discorrendo sobre o quão perfeito é o nome da sua rua, e o quanto a palavra 'bom' rima com a palavra 'destino'.. Ela ainda vai além, diz que é quase um insulto falar em destino e não pensar em 'bom', e vice-versa. Pra agradá-la um pouco mais, a Rua do Bom Destino é calma e silênciosa. Não é asfaltada, e nem deveria já que carros passam lá 2 vezes por ano; é repleta de árvores e sem saída. Não há um prédio sequer na rua, nem nada que atrapalhe Maria Isabel de enxergar o horizonte.
* Para não comprar uma briga, é aqui que eu paro de chamá-la pelo seu nome composto.. De agora em diante só usarei o seu nome preferido.*
E é por essas e outras que Maria ama sua rua, porém ama ainda mais a sua casa. Nem pequena nem grande, com um muro baixo, típico de casas antigas, cuja função se detém à estética. O número é 9, que é, não por conicidência, seu número da sorte. A casa é de um tom verde claro -  há quem diga que é creme, mas Maria logo corrige "é V-E-R-D-E!", exclama irritada.
Maria é extremamente simpática, doce e de uma leveza cativante. No dia em que se mudou para lá já conquistou todos os vizinhos, que não conseguem conter o sorriso ao ver tanta delicadeza na pessoa mais desastrada do universo. Uma topada em cada esquina e um risinho envergonhado fazem parte da rotina de Maria.
Às vezes me pego pensando se conheço alguém com mais sonhos que Maria. Ela tem um jeito tão inocente de enxergar o mundo que me faz achar que nunca completará os tãos sonhados 14 anos. Mas talvez seja graças a essa inocência que Maria carregue uma alma tão revolucionária - eu ousaria até dizer que, se existe essa tal de reencarnação, ela é a própria Chê Guevara (RISOS). Poucas coisas a tiram do sério, mas se você deseja vê-la irritada, diga pra ela desistir de seus ideais; fale que nem ela e nem ninguém tem o poder de mudar o mundo.







(Terá continuação. Talvez.)

domingo, 3 de abril de 2011

Tal qual a Lua

E, justamente, porque dei voz ao coração não posso reclamar quando ele insiste em falar. Não posso ousar calá-lo quando ele grita, quando ele cospe tudo que o preenche. Não posso reclamar quando vejo uma folha em branco e ele remexe, revira e aperta até eu escrever o que ele manda. Não posso achar ruim a necessidade de publicar pra quem quer que seja a minha dor, ou melhor, a dor dele - talvez na tentativa de transformar o desabafo em algo útil, algo palpável. Confesso que não são poucas as vezes que tenho vontade de tirar ele de mim, ele e toda essa intransigência bem característica dele. E provavelmente já teria o feito se fosse possível.. E teria me arrependido. O segredo é não dar as costas para a tristeza, não tentar fugir da dor. Quando você amadurece percebe que a dor é mais uma fase, dentre as tantas outras da vida, da qual não se pode fugir. Talvez, com muito jogo de cintura, dê para adiá-la. Só que mais cedo ou mais tarde ela volta e passa na sua cara o quanto você foi imaturo tentando fugir. Isso já aconteceu comigo algumas vezes, fugi da dor e lá na frente ela apareceu; e apareceu com tanta força que quase criou boca e me chamou de estúpida por tentar fugir de coisas que precisam ser vividas alguma hora. Dessa vez eu decidi, não quero me sentir estúpida, burra, criança. Não quero adiar nada. Dê um tempo pro meu coração falar o quanto dói, mas não esqueça que é só uma fase. E fases acabam a qualquer momento. Eu sei que em breve meu coração vai tá cantando, batendo e fazendo rimas tão alegres que nos fará sorrir de novo.. Distante, porém felizes.

Valor

Coisas, pessoas, sentimentos, tudo tem - ou deveria ter - valor. E o termo "se dar valor" tem uma origem bem complexa, digo isso porque para pessoas, diferente de mercadorias, não há um valor fixo, não há um padrão. Sendo assim, cada um se comporta de acordo com o valor que acredita ter. Cada um "se valoriza" como pode.. O difícil é quando nada mais parece ter importância. Quando sua própria vida (e com ela sua saúde, seus sentimentos, seus ideiais e sua imagem) perdeu o valor. (É irônico quando alguém que não lhe valorizou abre a boca pra falar "se valorize"). Acredite, quando as pessoas mais importantes lhe dão as costas você esquece que tem valor.