domingo, 18 de novembro de 2012

Tempo

Dezenove horas, ela espera. Se aproxima o pequeno instante no qual eles sentem aquela incômoda sensação de frio na barriga e coração acelerado, que a essas alturas é quase imperceptível, mas ainda existe porquê - e somente porquê - eles se recusam a deixar apagar essa última emoção palpável. Emoção a qual ainda move suas vidas. Na casa vazia o tic-tac do relógio causa uma angústia que ela finge não sentir, preferindo ofuscar todo o silêncio e barulho com um confortante e desafinado assovio. Tantos pensamentos, tantas lembranças e sonhos - perdidos e realizados - passam pela sua cabeça, enquanto o relógio insiste em se arrastar. Jantar pronto, mesa posta, dezenove horas e vinte e cinco minutos. Ela começa a preparar o café, sabendo que ficará pronto no momento exato, quando ele chegar. E fundamenta essa rotina metódica nas péssimas garrafas pseudotérmicas fabricadas hoje em dia - sabendo, no fundo, que o cheiro de café quentinho da pra se sentir no elevador, e é apenas mais um apelo, mas uma ferramenta desesperada de conquista, na tentativa diária de transformar aquele ambiente estranho e hostil em um lar. Café pronto, a campainha toca. Ela se arrasta até a porta, e o reencontro se firma com aquele antigo abraço apertado, que a essas alturas fala, por si só, que as coisas não são mais como antigamente. Ela pergunta como foi o dia. Ele diz que sentiu saudades. E como sempre souberam, tudo é completamente firme, calmo e estático. O que o conforta profundamente. O que a enlouquece.